segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Bumbum na nuca?????

Acredito realmente que a obsessão de uma boa parte das brasileiras seja o bumbum. O 'padrão' nacional prevê que um glúteo avantajado seja diretamente proporcional à beleza do corpo da mulher o que acabou fortalecendo o estereotipo de 'mulher fruta'. 
O mais lamentável é o que elas não contam pra gente... Então pega sua cinta modeladora e sua caneleira e vamos conversar um pouco... Acho que a primeira coisa a se entender é que glúteo é uma musculatura, igual as outras... o que significa que essa musculatura quando devidamente trabalhada deve promover resultados hipertróficos... Isso é bem diferente de um popozão tamanho G bem redondo. Mulheres tendem a acumular gordura na região dos quadris e coxas por uma ação hormonal. A liberação de estrógeno com a maturação sexual começa a deixar as formas das meninas 'mais curvilíneas', dando o formato arredondado das mulheres. Por outro lado, a testosterona (hormônio presente nos homens em grande quantidade em comparação às mulheres) é um hormônio que aumenta a síntese proteica (com um dos efeitos sendo o ganho de massa magra) e favorece a lipolise. Aí a gente começa a se perguntar sobre as moças de 'abdome quadradinho'... Isso porque é muito difícil conseguir degradar tanta gordura na região do tronco tendo os níveis de estrógeno altos e de testosterona baixos (como é o caso das mulheres 'normais'). Se essa moça treina e usa recursos anabólicos, junto com o abdomen trincado, o quadril tende a ficar mais estreito (porque há menos acúmulo de gordura nos membros inferiores). Isso é GLUTEO, ou seja... o músculo em si trabalhado, hipertrofiado e com um baixo percentual de gordura! A foto é só pra ilustrar, ok? 


Maaaaaaaaaaaas aí vem uma contradição: como num mundo fitness eu vou assegurar meu 'popozão brasileiro'? Quero um abdomen trincado, um baixo percentual de gordura e um bumbum redondinho e grandão.... Não vai dar.... O problema amigos, é que as moças nunca contam pra gente que o milagre daqueles bumbuns é muito mais acrílico do que foco, força e fé! O jeito é apelar pra aplicações como o hidrogel (e correr o risco de entupir suas artérias, ter necrose tecidual, etc...) pra garantir aquele bumbunzão que tá cada dia maior! E você achando que tava fazendo pouca série de caneleira, né? Calma, eu também achava isso....


O que me deixa mais inconformada é que por anos venho vendo pessoas sendo ludibriadas, acreditando que não obtém os mesmos resultados porque não treinam o suficiente. Enquanto isso, há uma legião de pessoas vendendo essa ilusão nas redes sociais e usando de imagens irreais pra comercializarem aplicativos, treinos mágicos e outras baboseiras que fazem você acreditar que vai ficar igual a ela só com frango e batata doce e muitas aulas de localizada. 
     Eis um exemplo de antes e depois de aplicação de hidrogel.

O glúteo é uma musculatura com grande proporção de fibras do tipo II e grande área de secção transversa. Isso faz com que responda a um estímulo preferencialmente com elevada produção de força: em outras palavras, alta intensidade na contração muscular. Os estudos que verificaram uma variedade de exercícios na ação dos membros inferiores vem destacando a importancia do stiff, leg press e das variações de agachamento são indiscutíveis. Mas é preciso, sobretudo, analisar a interferência da manipulação das variáveis de treinamento: amplitude de execução (biomecânica e cinesiologia), sobrecarga (trabalhos realizados na pré-fadiga ou até a fadiga total) e volume de trabalho (numero de repetições máximas) para assegurar um trabalho eficiente. Pra se ter uma ideia, a amplitude do agachamento pode variar o recrutamento do glúteo entre 17% se ele for parcial e salta pra 35% se for um agachamento completo. Mas a vantagem está justamente no fato de que os exercícios que eu citei serem ativações multiarticulares, o que recrutaria (e muito) a musculatura de quadríceps (trabalhando o bumbum e as coxas ao mesmo tempo). Então este tipo de treinamento teria uma enorme vantagem em relação aos exercícios que tendemos a realizar com caneleiras, por exemplo.... Além disso, nem preciso falar que a caneleira não traz uma sobrecarga poderosa pra ajudar nas nossas fibras tipo II da região do glúteo. 
Bom, pra isso não virar uma apostila com 300 páginas eu vou parar por aqui, deixando pro próximo post a discussão sobre estrutura do treino de membros inferiores que parece ser bastante efetiva. 




quarta-feira, 12 de outubro de 2016

A DIETA INFALÍVEL PRA VOCÊ PERDER PESO ATÉ O VERÃO


Resolvi fazer um post com um título super sensacionalista... tipo blogueira mexxxxxmo. Quem não quer uma dieta que resolva em tempo o seu problema até o verão? E se ela for milagrosamente rápida então... Nem se fala. O que não falta são alternativas...


Sério, se pelo menos uma única dessas promissoras e milagrosas dietas funcionassem, alguma revista venderia o número do mês seguinte? Mas quem quer um milagre nem pensa, sai logo acreditando no que quer acreditar! 😔
Eu como boa mulher que sou, já fiz TODAS as dietas existentes 🙈. Quando eu era bebê minha mãe me alimentava exclusivamente com leite materno e o pediatra perguntava com o que ela me suplementava, porque eu já era obesinha. Aos sete, quando fui pro colégio, sonhava em vestir uma calça jeans. Não existia nenhuma infantil que fechasse em minha cintura. Então eu comecei aos sete anos de idade a minha primeira dieta. Era a do vigilantes do peso e minha avó me levava pra caminhar todos os dias. Aos nove fui fazer balé e só comecei a modificar minha composição corporal lá pelos doze. Magra, nunca! Eutrófica, apenas...


Aí aos 15 começou o efeito sanfona e aos 17 eu fiz a tal da dieta da USP ou dieta Japonesa... sei lá eu como chamam isso hoje! Mas lembro que me falaram que essa dieta fazia perder 7kg em 7 dias! Nem nos meus melhores sonhos eu podia imaginar isso. Claro que não foi assim, não foram 7kg em 7 dias... Foram alguns quilos sim, mas eu praticamente desmaiava de fome por almoçar dois ovos cozidos depois de um café da manhã com 1 xícara de café sem açúcar. Nesta época tive meu primeiro contato com a musculação. Tive muitos problemas com a minha imagem corporal, um início de distúrbio alimentar... Foi rápido e antes que a situação se agravasse foi tudo controlado. 
Neta época eu estava com o meu peso mais baixo... em torno de 50kg... Neste contexto, eu resolvi fazer Educação Física porque queria dar aula de balé e ser personal trainer. Quando entrei na faculdade pesava 55kg e aí sim! Morando sozinha eu podia me entupir de bisnaguinha e brigadeiro todo dia... Mas aos 18 anos, você não tem carro e só de andar pra lá e pra cá de bicicleta, consegue se manter. No segundo ano de faculdade comecei a ganhar peso.  Já estava ligada no lance de mestrado e fui me tornando super sedentária. Terminei a faculdade com pelo menos 10kg a mais do que comecei. Quando terminei o mestrado já estava com 5kg a mais e no segundo ano de doutorado o montante já somava um total de 25kg! Jesus amado. Neste meio tempo eu tentei dieta de tudo que é jeito... É impossível lembrar tudo que eu tentei, mas entre os procedimentos somam-se Dukan, Atkins, Herbalife, dieta de Bervelly Hills, dieta dos pontos, dieta da sopa, da lua, do leite  (que vergonha alguém que estuda tanto confessar isso, meu Deus!) e pra finalizar uma lipoaspiração de abdômen (já falei sobre o quanto a lipoaspiração não funciona neste post. Eu queria tanto que alguém tivesse escrito um post assim pra eu não gastar dinheiro a toa). Enfim... passei 5 anos com esses 25kg a mais.... Hora eu perdia 10kg, hora eu perdia 8kg, mas SEMPRE em um tempo record vinha um reganho de peso assombroso. Se eu perdia 10kg, ganhava 12kg na sequência. As coisas só mudaram quando eu resolvi entender como meu corpo funciona de verdade e parar de fazer loucuras esperando resultados milagrosos....🙏🏼
Bom, o objetivo do post não é fazer um relato de auto-ajuda. Eu, que AMO trabalhar com evidência científica, sempre busco nas publicações uma base pra escrever meus textos e na verdade a ideia deste depoimento pessoal é ilustrar um paper muito bacana, mesmo que já seja antiguinho. Em 2009 um artigo incrível foi muito divulgado pelas revistas comuns e causou um frisson, porque ele comparava a eficiência de diferentes dietas com variações nas proporções da distribuição de carboidratos, proteínas e gorduras no montante final de aporte calórico. Este estudo incrível publicado no New England (meu sonho na vida é publicar neste jornal) avaliou os efeitos de quatro distribuições diferentes de dietas em 800 indivíduos adultos obesos com IMC variando entre 25 e 40. O estudo consistiu em avaliar o metabolismo de repouso e o gasto calórico individual e provocar um deficit de 750kcal em cada um dos participantes. As dietas variavam assim: dois grupos com baixo aporte de gordura (20%) e com uma variação entre 15 e 25% de proteínas (o restante eram carboidratos) e outros dois grupos eram com alta quantidade de gordura (40%) e a variação proteica entre os grupos também foi de 15 e 25%. Então, basicamente duas dietas low-fat e duas high-fat. Dos 811 participantes, 645 terminaram o estudo que durou dois anos. Os resultados demonstraram uma perda de peso semelhante em ambos os grupos. Isso mesmo! Independente do que se comeu, o balanço energético foi mais determinante pra perda de peso do que a composição da dieta. A perda de peso acentuada ocorreu nos primeiros seis meses e depois foi mais lenta, como já era esperado. O interessante deste estudo foi que ele analisou os participantes 1 anos depois de terminado o acompanhamento da dieta e verificou que em todos os grupos houve um gradual reganho de peso. Apenas 185 destes participantes continuaram perdendo peso. Isso demonstra duas coisas: 1) Não existe dieta milagrosa, seu organismo responde de acordo com o aporte energético e com o balanço de macro e micronutrientes ingeridos e; 2) Não adianta fazer dieta! O segredo é o equilíbrio pra conseguir manter os ganhos obtidos a partir das perdas decorrentes do balanço energético. 
Agora você pode pensar: - "Vou fazer a dieta da moda, perder um montão de peso rapidinho pro verão" 🙋🏼... Mas quem já fez este tipo de coisa sabe que vai engordar de novo! Sabe por que? Em 2007 uma revisão de literatura muito legal (link pra ler aqui) demonstrou uma hipótese chamada de TERMOGÊNESE ADAPTATIVA. Basicamente seu corpo trabalha pra conservar energia porque ele ainda lembra da necessidade de acumular gordura como meio de sobrevivência, coisa que quando morávamos nas cavernas era fundamental pra assegurar a sobrevivência. Então quando você diminui drasticamente o aporte energético ele não entende que você quer isso e está de dieta, ele acha que você está em privação de alimentos e automaticamente ele reduz seu metabolismo pra compensar a baixa energética. Se além da restrição alimentar, você também não fizer o exercício correto e houver perda de massa magra, o metabolismo baixa ainda mais e aí tudo fica difícil.



McGuire (1999) demonstrou que entre 80-90% dos adultos e crianças que perderam peso com dietas, voltaram a engordar. Como nosso metabolismo funciona em reações de cascatas e o desbalanço energético gera um estímulo importante reconhecido pelo sistema nervoso central, os mecanismos que envolvem estas vias são inúmeros e demandam função neuroendócrina. Não vem ao caso discutir tudo que acontece, mas o importante é lembrar que até agora, os estudos demonstram que o maior aliado na manutenção dos ganhos (ou melhor, das perdas!) é a prática de exercícios pra manutenção de massa magra e, consequentemente, adaptações que estimulem um aumento do metabolismo de repouso. 


No próximo post eu falo sobre exercícios neste processo, senão isso aqui vira um livro! 



Referências

Major, G. C., Doucet, E., Trayhurn, P., Astrup, A., & Tremblay, A. (2007). Clinical significance of adaptive thermogenesis. International journal of obesity, 31(2), 204-212.

McGuire M, Wing R, Klem M, Hill J. Behavioral strategies of individuals who have maintained long-term weight losses. Obes Res. 1999;7:334–41.

Rosenbaum, M., & Leibel, R. L. (2010). Adaptive thermogenesis in humans. International journal of obesity, 34, S47-S55.

Sacks, F. M., Bray, G. A., Carey, V. J., Smith, S. R., Ryan, D. H., Anton, S. D., ... & Leboff, M. S. (2009). Comparison of weight-loss diets with different compositions of fat, protein, and carbohydrates. New England Journal of Medicine, 360(9), 859-873.



terça-feira, 4 de outubro de 2016

Açúcar: O vício consentido.

Quando falamos em dependência química sempre nos vem a cabeça as drogas ilícitas. Se eu falar em pó branco que ativa áreas de prazer do cérebro, obviamente pensamos em Cocaína. Uma droga muito poderosa, que gera descargas de neurotransmissores que nos fazem sentir prazer... muito prazer... Mas e se eu disser que você tem em casa uma droga que possui um poder de ativação de áreas de prazer no cérebro que pode superar em até nove vezes a cocaína em relação a te deixar dependente dela e que custa bem menos? Pois é! Os cientistas encontraram que o açúcar possui um potencial de ativar circuitos de prazer e recompensa por meio da liberação de dopamina e endorfinas de maneira similar ao que ocorre com a cocaína. 
No caso do açúcar, o mecanismo fisiológico faz com que nós queiramos cada vez mais e mais as calorias fornecidas por meio dele. Isso porque a glicose que vem do açúcar rapidamente sinaliza para a liberação de insulina. A insulina, por sua vez, sinaliza para inibir a oxidação de gordura (porque as gorduras são reserva! Se tiver açúcar disponível, o corpo prefere sempre usar o açúcar ao invés de "mexer na reserva"). Mas provavelmente você não irá gastar imediatamente toda a energia ingerida pelo carboidrato que você consumiu, então seu corpo irá iniciar o armazenamento desta "sobra"em forma de gordura (ou seja, você não gasta a gordura que já está estocada e ainda armazena mais a partir de qualquer forma de açúcar que foi consumida!). O papel da insulina liberada foi livrar sua corrente sanguínea de todo o açúcar que estava circulando, porque nosso corpo não lida bem com o açúcar no sangue... é uma substância bem nociva (haja visto os efeitos de uma glicemia alterada, principalmente em diabéticos e todos os problemas que isso causa!). Só que como consequência desta retirada do açúcar no sangue e do bloqueio da oxidação das gorduras pelo nosso organismo, nosso cérebro entende que o estoque de energia está se esgotando... E o que ele faz? Faz você sentir FOME... E aí você come mais! E quanto mais você come, mais alimenta esse ciclo.... Desta forma, você não está engordando porque come, mas você come porque está engordando. 

Mas pensa que o problema acabou aí? Claaaaaro que não! Nosso corpo funciona com mecanismos de feedback, ou seja,  se preciso de alguma substância para manter a homeostase, meu corpo é estimulado a produzí-la, mas se essa substância se encontra em abundância, o corpo irá produzir menos e ocorre uma dessensibilização de receptores, o que nos torna menos suscetíveis aos efeitos desta substância que está "sobrando". E é aí que o problema de dependência começa a acontecer... Você come cada vez mais, mas cada vez mais a sensação de prazer e saciedade promovida pelo alimento rico em açúcar vai ser mais rápida e menos intensa... fazendo com que você desenvolva comportamentos compulsivos. Por isso que alguns pesquisadores verificaram esta ativação semelhante no escaner cerebral de pessoas viciadas em cocaína e pessoas obesas. O indivíduo que tornou-se obeso, provavelmente sofreu esta alteração no cérebro e ela o fez comer descontroladamente, provocando a alteração na composição corporal. O problema de ganho de peso em obesos deixa de ser apenas metabólico e passa a envolver o sistema nervoso central. Tenso! 


Agora por último, uma questão beeeeeeeeeem perceptível: A dopamina é um neurotransmissor envolvido em circuitos límbicos, ou seja, aqueles que cuidam do nosso humor, emoções, etc... E eu falei ali em cima, que há uma dessensibilização de áreas cerebrais que recebem os sinais de prazer e bem estar proporcionados pela dopamina no sistema límbico. Então qualquer sensação de bem estar e prazer ficarão comprometidas... E a consequência disto será inevitavelmente uma alteração de humor e uma sensação de depressão, desmotivação... Então você come, sente fome, come mais, sente-se deprimido, sem energia e.... com mais fome! Aí come mais, e recomeça o ciclo... 
E isso explica porque é que nós quando nos descuidamos um pouquinho e começamos a comer descontroladamente, some a vontade de ir ao treino, some a vontade de tudo e ficamos inertes, sem ânimo e sem vontade de nada... E se nada quebrar este ciclo, tendemos a mergulhar nele, porque ele é altamente viciante. 

Em contrapartida, alimentos com baixo índice glicêmico fazem com que a liberação de insulina seja lenta e gradativa e, sem estes picos, não há o armazenamento de calorias como gordura e nem uma esta liberação exacerbada de dopamina pelo cérebro... Por isso a alimentação que prioriza baixa carga glicêmica faz com que tenhamos mais saciedade e, consequentemente, menos fome. Além disso, áreas de prazer são ativadas via liberação de endorfinas ao realizarmos atividades físicas... Ou seja, o serviço está completo! 


domingo, 25 de setembro de 2016

Lipoaspiração: o atalho que não te leva muito longe...

É natural que quem quer (e precisa!) perder peso normalmente antes de recorrer aos métodos notadamente saudáveis e que efetivamente funcionam, já tentaram todos os atalhos (shakes, géis, tratamentos, cintas modeladoras)... Tudo o que não tem comprovação científica, mas que a gente QUER que dê certo, porque é um caminho mais fácil e claro, requer um menor esforço do que se exercitar e restringir a alimentação. Num mundo competitivo, que vive do marketing e onde todo mundo quer ganhar dinheiro, não faltam opções na indústria da beleza, sempre promovidas por lindas moças que prometem que se você usar a cinta tal, se fizer o procedimento tal, se tomar o maravilhoso óleo de "num sei o que", você vai ficar com o "shape"perfeito. Neste contexto os médicos descobriram que as mulheres adorariam um procedimento cirúrgico que prometesse esse "milagre". 

O Brasil foi descrito pela revista Forbes como um dos líderes na realização de cirurgias plásticas. A prótese de mama lidera, mas a segunda colocada é, sem sombra de dúvidas a Lipoaspiração.



O que ninguém te conta é como seu corpo funciona por dentro, depois da lipoaspiração. Se nós pensarmos no mecanismo evolutivo, somos programados pra conservar energia. Em nossa evolução, ainda não deu tempo do corpo perceber que compramos comida no mercado e descobrimos a internet e o netflix pra "passar o tempo", então seu corpo ainda lembra da época que os antepassados precisavam sair da caverna pra caçar, aí você tinha que comer tudo aquilo e conservar aquela energia do alimento, porque provavelmente passaria muito tempo em privação de alimento até a próxima caça "dar sopa". E o meio que ele achou pra te proteger desta privação de calorias, foi acumulando o excesso em forma de gordura. Isso significa que nossa principal inimiga, foi quem provavelmente nos manteve vivos até descobrirmos o fast-food e o delivery da pizzaria. Por isso, qualquer mudança abrupta na nossa gordura corporal deverá acarretar alguma reação fisiológica. Bom, falei tudo isso pra começar o que interessa. 




Todo mundo sabe que este procedimento invasivo, consiste em retirar por sucção uma quantidade de gordura subcutânea. E aí você entra na sala do médico e diz: "Dotô, arranca tudo aí..." - afinal de contas custa caro e você imagina saindo da cirurgia com o corpão da Sabrina Sato na Sapucaí. Você só não imagina a dor, o inchaço e o cuidado do pós operatório, por pelo menos três meses que sucedem a intervenção... Mas isso é outro papo.  


Rinomhota e cols (2008), realizaram o que se conhece como o primeiro estudo clínico prospectivo para confirmar hipóteses que haviam sido verificadas em modelos animais. Até então, havia-se percebido que nos ratinhos em que se realizava uma retirada de gordura, eles respondiam com um acumulo de gordura compensatório. Mas a pior parte dos resultados: Eles compararam indivíduos que realizaram redução de mama com abdominoplastia e as diferenças aconteceram no grupo que retirou gordura do abdomen... Ou seja, o mecanismo compensatório funciona muito mais eficientemente na gordura do abdômen. TUDO QUE A GENTE QUER NA VIDA É ACUMULAR GORDURA NO ABDOME, NUM É NÃO? Este foi um primeiro estudo, cheio de falhas metodológicas no acompanhamento prospectivo que criam um monte de vieses para interpretar os resultados... Mas em 2015, Seretis e cols (2015) realizaram um estudo de revisão sistemática onde encontraram muitas evidências experimentais e clínicas de que realmente ocorre um mecanismo compensatório que leva ao acumulo de gordura corporal pós lipectomia.
O tecido adiposo tem uma característica endocrina, ou seja, ele secreta substâncias. Além disso, as células adiposas podem adaptar-se a diferences condições nutricionais e fisiológicas, aumentando ou diminuindo seu tamanho. O problema está aqui: Quando nós acumulamos energia em forma de gordura, há uma hipertrofia (aumento do tamanho) da célula adiposa, mas ela tem um limiar até onde pode crescer... Ao atingir este limiar, há uma cascata de sinalização que faz com que novas células (hiperplasia) de gordura sejam produzidas, e aí meu amigo... ela se apega à você e nunca mais vai embora. Isso aí, células adiposas criadas não "morrem"... Se você faz uma dieta, ela vai "murchar" (falei ali em cima 👆🏼 que elas se adaptam no tamanho), mas essas malditas não vão embora (Krotkiewski et al., 1983). Sendo assim, "arrancar" por sucção o tecido adiposo, configura-se na única maneira eficiente até agora demonstrada para se livrar deste montante de adipócito que você tem acumulado (Boriani et al., 2014), uma vez que com a dieta você só vai alterar o tamanho, não o número de células. 
No estudo de revisão sistemática que avaliou 10 estudos sobre lipoaspiração no abdome, os autores identificaram que há uma imediata diminuição de gordura abdominal e redução do peso corporal, entretanto ambos são gradualmente restituídos para os níveis pré-operatórios em até 3 meses após a cirurgia, podendo piorar em longo prazo. Em outras palavras:
Entra na cirurgia e sai mais magra, mas parece que depois de um ano (ou menos!) você já está de novo com uma quantidade de gordura próxima ao que tinha antes de operar 😔... Ou seja depois da lipo você perdeu mesmo foi dinheiro, e não gordura. A análise por ressonância magnética mostrou que esta gordura pode ser visceral (na maioria das vezes o acúmulo é visceral!!!) ou subcutânea e que o abdomen realmente tem preferência pra este "reganho". 
Mas o mais maluco de tudo isso é que 80% dos pacientes que tiveram estes efeitos após a lipoaspiração, relataram estar satisfeitos com os resultados, mesmo que 56% soubessem que haviam recuperado a gordura corporal "sugada" (Broughton et al., 2006). Ou seja, gastou dinheiro, sofreu e recuperou tudo mas mesmo assim acreditam que tá tudo maravilhoso! 🙄
Os mecanismos pelo qual este efeito ocorre ainda não foram elucidados, mas estima-se que há uma alteração na termogênese que induz o corpo a ficar com o peso que o nosso organismo entende como ideal. É preciso pensar que nosso corpo entende como peso ideal, aquele que assegurar sua sobrevida, ou seja, um peso que ele saiba que tem reserva energética (gordura) para possíveis períodos de privação alimentar. Qualquer intervenção abrupta para perda de peso (aquelas dietas mirabolantes que prometem 10kg em 15 dias), também podem ter este mesmo efeito. Mas sabe qual parece ser o principal aspecto? Adivinhem? A falta de exercício físico! E a gente já sabe, mas isso é assunto pra outro post, que o exercício que funciona melhor neste caso é o exercício de alta intensidade! Mas procure um bom profissional pra te ajudar nisso! 
Benatti e cols (2012), verificaram que ao promover um balanço energético negativo, mediado pelo exercício, é possível preservar os efeitos positivos deste tipo de intervenção. Mas o problema é que a maioria das pessoas que busca uma intervenção como esta, não está disposta a mudanças de estilo de vida... E aí, tudo foi perdido. 

Eu sou o exemplo disto. Fiz uma lipoaspiração no abdome e flancos e três meses depois eu estava exatamente igual, ou até pior. Isso foi em dezembro de 2010 (na foto estou de roupa de réveillon, usando uma cinta por baixo como parte do processo) e logo na sequência eu já estava precisando um novo jeito de perder peso 🙈.



Cinco anos depois disso tudo, a mudança do estilo de vida associando dieta com exercício me trouxeram o peso que eu não tinha desde 2004, quando estava na faculdade. Não tenho vergonha de dizer que fiz uma lipo, todo mundo viu que não adiantou NADA... Também não estou aqui pra dizer para as pessoas não fazerem uma lipoaspiração... Só estou trazendo dados científicos que comprovam que nosso corpo irá reagir se não houverem mudanças do ponto de vista metabólico e isso só pode ser revertido com exercício físico e uma dieta balanceada. Se o método cirúrgico for a escolha de alguém que estiver lendo este texto, só espero trazer uma informação que auxilie na manutenção dos ganhos, porque se eu tivesse lido esta revisão naquela época, ela talvez tivesse mudado alguma coisa, já que eu acredito muito na ciência. Eu mesma conheço um monte de gente que irá se identificar com esta minha história e agora poderá entender como nosso corpo reage. Pra ele é uma agressão chegar e arrancar de repente um monte de célula adiposa que ele tanto "custou"guardar pra te proteger... Ele não sabe que você quis isso, então pra te proteger ele tenta reverter a todo custo. 

O que fica destes estudos é que realmente não existe maneira de alcançar um bom resultado com um menor esforço. Por isso valorize os bons profissionais de educação física e nutricionistas, porque eles são a chave pra que seus esforços tragam bons resultados. 



Referências 


Benatti F, Solis M, Artioli G, et al. Liposuction induces a compensatory increase of visceral fat which is effectively counteracted by physical activity: a randomized trial. J Clin Endocrinol Metab. 2012;97:2388–95.

Boriani F, Villani R, Morselli PG. Metabolic effects of large- volume liposuction for obese healthy women: a meta-analysis of fasting insulin levels. Aesthet Plast Surg. 2014;38:1050–6. 

Broughton 2nd G, Horton B, Lipschitz A, et al. Lifestyle outcomes, satisfaction, and attitudes of patients after liposuction: a Dallas ex- perience. Plast Reconstr Surg. 2006;117:1738–49. 

Kennedy GC. The role of depot fat in the hypothalamic control of food intake in the rat. Proc R Soc Lond B Biol Sci. 1953;140:578–96 

Krotkiewski M, Bjorntorp P, Sjostrom L, et al. Impact of obesity on metabolism in men and women. Importance of regional adipose tissue distribution. J Clin Invest. 1983;72:1150–62. 

Rinomhota AS, Bulugahapitiya DU, French SJ, et al. Women gain weight and fat mass despite lipectomy at abdominoplasty and breas reduction. Eur J Endocrinol. 2008;158:349–52. 

Seretis K, Goulis DG, Koliakos G, Demiri E. Short-and Long-Term Effects of Abdominal Lipectomy on Weight and Fat Mass in Females: A Systematic Review. Obes Surg. 2015 Oct;25(10):1950-8. doi: 10.1007/s11695-015-1797-1. Review.