quarta-feira, 12 de outubro de 2016

A DIETA INFALÍVEL PRA VOCÊ PERDER PESO ATÉ O VERÃO


Resolvi fazer um post com um título super sensacionalista... tipo blogueira mexxxxxmo. Quem não quer uma dieta que resolva em tempo o seu problema até o verão? E se ela for milagrosamente rápida então... Nem se fala. O que não falta são alternativas...


Sério, se pelo menos uma única dessas promissoras e milagrosas dietas funcionassem, alguma revista venderia o número do mês seguinte? Mas quem quer um milagre nem pensa, sai logo acreditando no que quer acreditar! 😔
Eu como boa mulher que sou, já fiz TODAS as dietas existentes 🙈. Quando eu era bebê minha mãe me alimentava exclusivamente com leite materno e o pediatra perguntava com o que ela me suplementava, porque eu já era obesinha. Aos sete, quando fui pro colégio, sonhava em vestir uma calça jeans. Não existia nenhuma infantil que fechasse em minha cintura. Então eu comecei aos sete anos de idade a minha primeira dieta. Era a do vigilantes do peso e minha avó me levava pra caminhar todos os dias. Aos nove fui fazer balé e só comecei a modificar minha composição corporal lá pelos doze. Magra, nunca! Eutrófica, apenas...


Aí aos 15 começou o efeito sanfona e aos 17 eu fiz a tal da dieta da USP ou dieta Japonesa... sei lá eu como chamam isso hoje! Mas lembro que me falaram que essa dieta fazia perder 7kg em 7 dias! Nem nos meus melhores sonhos eu podia imaginar isso. Claro que não foi assim, não foram 7kg em 7 dias... Foram alguns quilos sim, mas eu praticamente desmaiava de fome por almoçar dois ovos cozidos depois de um café da manhã com 1 xícara de café sem açúcar. Nesta época tive meu primeiro contato com a musculação. Tive muitos problemas com a minha imagem corporal, um início de distúrbio alimentar... Foi rápido e antes que a situação se agravasse foi tudo controlado. 
Neta época eu estava com o meu peso mais baixo... em torno de 50kg... Neste contexto, eu resolvi fazer Educação Física porque queria dar aula de balé e ser personal trainer. Quando entrei na faculdade pesava 55kg e aí sim! Morando sozinha eu podia me entupir de bisnaguinha e brigadeiro todo dia... Mas aos 18 anos, você não tem carro e só de andar pra lá e pra cá de bicicleta, consegue se manter. No segundo ano de faculdade comecei a ganhar peso.  Já estava ligada no lance de mestrado e fui me tornando super sedentária. Terminei a faculdade com pelo menos 10kg a mais do que comecei. Quando terminei o mestrado já estava com 5kg a mais e no segundo ano de doutorado o montante já somava um total de 25kg! Jesus amado. Neste meio tempo eu tentei dieta de tudo que é jeito... É impossível lembrar tudo que eu tentei, mas entre os procedimentos somam-se Dukan, Atkins, Herbalife, dieta de Bervelly Hills, dieta dos pontos, dieta da sopa, da lua, do leite  (que vergonha alguém que estuda tanto confessar isso, meu Deus!) e pra finalizar uma lipoaspiração de abdômen (já falei sobre o quanto a lipoaspiração não funciona neste post. Eu queria tanto que alguém tivesse escrito um post assim pra eu não gastar dinheiro a toa). Enfim... passei 5 anos com esses 25kg a mais.... Hora eu perdia 10kg, hora eu perdia 8kg, mas SEMPRE em um tempo record vinha um reganho de peso assombroso. Se eu perdia 10kg, ganhava 12kg na sequência. As coisas só mudaram quando eu resolvi entender como meu corpo funciona de verdade e parar de fazer loucuras esperando resultados milagrosos....🙏🏼
Bom, o objetivo do post não é fazer um relato de auto-ajuda. Eu, que AMO trabalhar com evidência científica, sempre busco nas publicações uma base pra escrever meus textos e na verdade a ideia deste depoimento pessoal é ilustrar um paper muito bacana, mesmo que já seja antiguinho. Em 2009 um artigo incrível foi muito divulgado pelas revistas comuns e causou um frisson, porque ele comparava a eficiência de diferentes dietas com variações nas proporções da distribuição de carboidratos, proteínas e gorduras no montante final de aporte calórico. Este estudo incrível publicado no New England (meu sonho na vida é publicar neste jornal) avaliou os efeitos de quatro distribuições diferentes de dietas em 800 indivíduos adultos obesos com IMC variando entre 25 e 40. O estudo consistiu em avaliar o metabolismo de repouso e o gasto calórico individual e provocar um deficit de 750kcal em cada um dos participantes. As dietas variavam assim: dois grupos com baixo aporte de gordura (20%) e com uma variação entre 15 e 25% de proteínas (o restante eram carboidratos) e outros dois grupos eram com alta quantidade de gordura (40%) e a variação proteica entre os grupos também foi de 15 e 25%. Então, basicamente duas dietas low-fat e duas high-fat. Dos 811 participantes, 645 terminaram o estudo que durou dois anos. Os resultados demonstraram uma perda de peso semelhante em ambos os grupos. Isso mesmo! Independente do que se comeu, o balanço energético foi mais determinante pra perda de peso do que a composição da dieta. A perda de peso acentuada ocorreu nos primeiros seis meses e depois foi mais lenta, como já era esperado. O interessante deste estudo foi que ele analisou os participantes 1 anos depois de terminado o acompanhamento da dieta e verificou que em todos os grupos houve um gradual reganho de peso. Apenas 185 destes participantes continuaram perdendo peso. Isso demonstra duas coisas: 1) Não existe dieta milagrosa, seu organismo responde de acordo com o aporte energético e com o balanço de macro e micronutrientes ingeridos e; 2) Não adianta fazer dieta! O segredo é o equilíbrio pra conseguir manter os ganhos obtidos a partir das perdas decorrentes do balanço energético. 
Agora você pode pensar: - "Vou fazer a dieta da moda, perder um montão de peso rapidinho pro verão" 🙋🏼... Mas quem já fez este tipo de coisa sabe que vai engordar de novo! Sabe por que? Em 2007 uma revisão de literatura muito legal (link pra ler aqui) demonstrou uma hipótese chamada de TERMOGÊNESE ADAPTATIVA. Basicamente seu corpo trabalha pra conservar energia porque ele ainda lembra da necessidade de acumular gordura como meio de sobrevivência, coisa que quando morávamos nas cavernas era fundamental pra assegurar a sobrevivência. Então quando você diminui drasticamente o aporte energético ele não entende que você quer isso e está de dieta, ele acha que você está em privação de alimentos e automaticamente ele reduz seu metabolismo pra compensar a baixa energética. Se além da restrição alimentar, você também não fizer o exercício correto e houver perda de massa magra, o metabolismo baixa ainda mais e aí tudo fica difícil.



McGuire (1999) demonstrou que entre 80-90% dos adultos e crianças que perderam peso com dietas, voltaram a engordar. Como nosso metabolismo funciona em reações de cascatas e o desbalanço energético gera um estímulo importante reconhecido pelo sistema nervoso central, os mecanismos que envolvem estas vias são inúmeros e demandam função neuroendócrina. Não vem ao caso discutir tudo que acontece, mas o importante é lembrar que até agora, os estudos demonstram que o maior aliado na manutenção dos ganhos (ou melhor, das perdas!) é a prática de exercícios pra manutenção de massa magra e, consequentemente, adaptações que estimulem um aumento do metabolismo de repouso. 


No próximo post eu falo sobre exercícios neste processo, senão isso aqui vira um livro! 



Referências

Major, G. C., Doucet, E., Trayhurn, P., Astrup, A., & Tremblay, A. (2007). Clinical significance of adaptive thermogenesis. International journal of obesity, 31(2), 204-212.

McGuire M, Wing R, Klem M, Hill J. Behavioral strategies of individuals who have maintained long-term weight losses. Obes Res. 1999;7:334–41.

Rosenbaum, M., & Leibel, R. L. (2010). Adaptive thermogenesis in humans. International journal of obesity, 34, S47-S55.

Sacks, F. M., Bray, G. A., Carey, V. J., Smith, S. R., Ryan, D. H., Anton, S. D., ... & Leboff, M. S. (2009). Comparison of weight-loss diets with different compositions of fat, protein, and carbohydrates. New England Journal of Medicine, 360(9), 859-873.



terça-feira, 4 de outubro de 2016

Açúcar: O vício consentido.

Quando falamos em dependência química sempre nos vem a cabeça as drogas ilícitas. Se eu falar em pó branco que ativa áreas de prazer do cérebro, obviamente pensamos em Cocaína. Uma droga muito poderosa, que gera descargas de neurotransmissores que nos fazem sentir prazer... muito prazer... Mas e se eu disser que você tem em casa uma droga que possui um poder de ativação de áreas de prazer no cérebro que pode superar em até nove vezes a cocaína em relação a te deixar dependente dela e que custa bem menos? Pois é! Os cientistas encontraram que o açúcar possui um potencial de ativar circuitos de prazer e recompensa por meio da liberação de dopamina e endorfinas de maneira similar ao que ocorre com a cocaína. 
No caso do açúcar, o mecanismo fisiológico faz com que nós queiramos cada vez mais e mais as calorias fornecidas por meio dele. Isso porque a glicose que vem do açúcar rapidamente sinaliza para a liberação de insulina. A insulina, por sua vez, sinaliza para inibir a oxidação de gordura (porque as gorduras são reserva! Se tiver açúcar disponível, o corpo prefere sempre usar o açúcar ao invés de "mexer na reserva"). Mas provavelmente você não irá gastar imediatamente toda a energia ingerida pelo carboidrato que você consumiu, então seu corpo irá iniciar o armazenamento desta "sobra"em forma de gordura (ou seja, você não gasta a gordura que já está estocada e ainda armazena mais a partir de qualquer forma de açúcar que foi consumida!). O papel da insulina liberada foi livrar sua corrente sanguínea de todo o açúcar que estava circulando, porque nosso corpo não lida bem com o açúcar no sangue... é uma substância bem nociva (haja visto os efeitos de uma glicemia alterada, principalmente em diabéticos e todos os problemas que isso causa!). Só que como consequência desta retirada do açúcar no sangue e do bloqueio da oxidação das gorduras pelo nosso organismo, nosso cérebro entende que o estoque de energia está se esgotando... E o que ele faz? Faz você sentir FOME... E aí você come mais! E quanto mais você come, mais alimenta esse ciclo.... Desta forma, você não está engordando porque come, mas você come porque está engordando. 

Mas pensa que o problema acabou aí? Claaaaaro que não! Nosso corpo funciona com mecanismos de feedback, ou seja,  se preciso de alguma substância para manter a homeostase, meu corpo é estimulado a produzí-la, mas se essa substância se encontra em abundância, o corpo irá produzir menos e ocorre uma dessensibilização de receptores, o que nos torna menos suscetíveis aos efeitos desta substância que está "sobrando". E é aí que o problema de dependência começa a acontecer... Você come cada vez mais, mas cada vez mais a sensação de prazer e saciedade promovida pelo alimento rico em açúcar vai ser mais rápida e menos intensa... fazendo com que você desenvolva comportamentos compulsivos. Por isso que alguns pesquisadores verificaram esta ativação semelhante no escaner cerebral de pessoas viciadas em cocaína e pessoas obesas. O indivíduo que tornou-se obeso, provavelmente sofreu esta alteração no cérebro e ela o fez comer descontroladamente, provocando a alteração na composição corporal. O problema de ganho de peso em obesos deixa de ser apenas metabólico e passa a envolver o sistema nervoso central. Tenso! 


Agora por último, uma questão beeeeeeeeeem perceptível: A dopamina é um neurotransmissor envolvido em circuitos límbicos, ou seja, aqueles que cuidam do nosso humor, emoções, etc... E eu falei ali em cima, que há uma dessensibilização de áreas cerebrais que recebem os sinais de prazer e bem estar proporcionados pela dopamina no sistema límbico. Então qualquer sensação de bem estar e prazer ficarão comprometidas... E a consequência disto será inevitavelmente uma alteração de humor e uma sensação de depressão, desmotivação... Então você come, sente fome, come mais, sente-se deprimido, sem energia e.... com mais fome! Aí come mais, e recomeça o ciclo... 
E isso explica porque é que nós quando nos descuidamos um pouquinho e começamos a comer descontroladamente, some a vontade de ir ao treino, some a vontade de tudo e ficamos inertes, sem ânimo e sem vontade de nada... E se nada quebrar este ciclo, tendemos a mergulhar nele, porque ele é altamente viciante. 

Em contrapartida, alimentos com baixo índice glicêmico fazem com que a liberação de insulina seja lenta e gradativa e, sem estes picos, não há o armazenamento de calorias como gordura e nem uma esta liberação exacerbada de dopamina pelo cérebro... Por isso a alimentação que prioriza baixa carga glicêmica faz com que tenhamos mais saciedade e, consequentemente, menos fome. Além disso, áreas de prazer são ativadas via liberação de endorfinas ao realizarmos atividades físicas... Ou seja, o serviço está completo!